Planetários Itinerantes: o domo inflável e o projetor analógico.

Imagem de capa: Planetarista apresenta o céu a um grupo de crianças. Criada por IA Copilot, 2024.

Desenhos: realizados por crianças após assistirem uma sessão do planetário.

O Domo Inflável

Após várias tentativas frustradas de construir um domo leve e de fácil montagem com seus estudantes, o Prof. Philip M. Sadler passou em frente a uma grande “bolha branca” que já tinha visto muitas vezes, mas nunca parado para observá-la.

Sua invenção, o Planetário Portátil Starlab, permitiu que muitas escolas fornecessem experiências de aprendizado ativo para alunos que estão estudando astronomia. Antes que esse dispositivo estivesse disponível, apenas as escolas ou faculdades que estavam localizadas perto de um planetário existente podiam oferecer tais experiências, e então elas eram limitadas pelas despesas de viagem até a instalação. Os materiais e currículos desenvolvidos por Sadler são usados ​​por cerca de doze milhões de alunos todos os anos.  

Fonte: https://aapt.org/aboutaapt/sadler_2012millikan_pr20120402.cfm

Sadler fez contribuições substanciais ao ensino de física ao longo de várias décadas. Seu trabalho sobre concepções de alunos levou à produção da premiada série de documentários, “A Private Universe” e “Minds Of Our Own”, com o colega Matthew Schneps, vídeos que continuam a influenciar a prática em sala de aula. Este trabalho também promoveu o conhecimento acadêmico sobre a compreensão dos alunos sobre ciências físicas e astronomia.

Apesar de tendas infláveis em diversos formatos (balões, arcos, portais, domos) serem comuns atualmente, isso era uma novidade em sua época.

David Flett duPont deixou um legado de um milhão de dólares para a melhoria das instalações esportivas do MIT, e assim, o duPont Athletic Center foi aberto à comunidade do MIT em 1959. O legado de duPont também levou à construção de 12 quadras de tênis ao ar livre, com quatro quadras cobertas.

A tenda de tênis do MIT, a inspiração para o domo de planetário inflável.

A tenda inflável tratava-se da grande tenda da quadra de tênis do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) – uma grande estrutura inflável, sustentada apenas pela pressão do ar.

Sadler comenta que:

“Eu então resolvi adotar esta estrutura ao nosso projeto de planetário. E logo, estava calculando as quantidades de tecido e a potência de ar para uma versão menor. Entretanto, construir algo esférico (domo do planetário) a partir de uma coisa plana não é um problema simples.

A solução reside nas centenas de anos da história da construção de mapas.

Os mapas são uma representação plana de um globo esférico.

Além disso, olhando de perto, a maioria dos globos, parecem sendo feitos de faixas planas de papel. Uma pesquisada pelos mapas cartográficos e uma conversa com um amigo geometricamente talentoso, Mitchell Lazarus, resultou em um designe utilizando 4 gomos sinusoidais”.

Globo terrestre fatiado em gomos para modelo planificado.

Nós fizemos a planta destas formas em folhas gigantes de papel, usando-as como modelos. Cortamos quatro gomos de um tecido preto opaco de polietileno e, então, os colamos cuidadosamente ao tecido branco da superfície interna. No segundo dia, conectamos o ventilador à pilha de cola, fita e tecidos. O planetário foi tomando forma, enchendo e criando um espaçoso domo. Logo os meus estudantes estariam fazendo shows de planetário para todas as turmas em nossa escola. Ficamos muito felizes com o sucesso do projeto, após tantas frustações anteriores.

Estudantes de Sadler.
O domo faz seus primeiros testes com estudantes.

As novidades da invenção se espalharam.

Nosso diretor organizou várias apresentações. Outros professores queriam que nós visitássemos suas escolas. Alguns queriam fazer seus próprios planetários.

Eu refinei o designe, construindo um novo modelo de domo com oito gomos.

Um projetor itinerante para o domo inflável

Sadler não ficou satisfeito com o modelo por conta do projetor. Ele afirma:

Embora o domo do planetário funcionasse bem, eu não estava contente com o meu projetor de estrelas. O projetor de brinquedo que tinha me encantado quando criança, não era mais adequado para esta tarefa.

Eu queria uma simulação melhor do céu noturno, com milhares de estrelas.

Eu modifiquei o meu projetor de infância, adicionando centenas de novas estrelas e corrigindo seus erros de fabricação (por exemplo, ele projetava apenas duas estrelas no cinturão de Órion). Mas, eu queria algo mais que melhorasse a eficiência de nosso novo domo.

Eu comecei a investigar os projetores existentes. Haviam dois modelos básicos.

Os projetores Zeiss usavam uma lâmpada central que iluminava dezenas de placas com pequenos furos, cada um com uma lente própria.

O modelo Spitz usa uma lâmpada central que projeta através de uma esfera furada de precisão (furos maiores usam lentes para colimar os feixes de luz).

Cada modelo possui suas vantagens, mas ambos são caros de fabricar.

Eu estava convencido de que era possível outro caminho para projetar imagens de estrelas a um custo mais barato.

Como criar um cilindro que pensa que é uma esfera?

Tendo resolvido o problema de construir um domo a partir de um tecido plano, uma transformação similar foi necessária para desenvolver um novo projetor.

A topologia nos diz que rosquinhas e xícaras de café são similares, por terem a mesma quantidade de furos. Uma pode ser matematicamente reformatada na outra. Da mesma forma, uma esfera pode ser reformatada em um cilindro.

Se a esfera celeste pudesse ser reformatada em um cilindro celeste, então ele poderia ser fabricado de uma maneira mais fácil com folhas planas. Minhas experiências anteriores tinham me convencido de que áreas claras reproduzidas fotograficamente em filmes eram opticamente idênticas a furos físicos e eles poderiam ser reproduzidos mais fácil e acuradamente.

Dois discos e um retângulo comprido iriam produzir eficientemente “um cilindro que pensa que é uma esfera”.

Plotar as posições corretas e formas sobre superfície que iria produzir o céu noturno requer a acurácia de computadores. A parte superior e inferior de cada cilindro de projeção devem ser projeções gnomônicas acuradas do céu noturno, enquanto os lados são projetados cilindricamente, similar à projeção de Mercator (tipo de projeção cilíndrica do globo terrestre).

Eu modifiquei uma plotadora Hewlett Packard para fazer pequenos furos em uma folha plástica Mylar com uma agulha de safira.

Usando isto como um modelo fotográfico, o computador gerou mapas que projetavam incríveis e precisos campos estelares.

Com um novo designe para o domo e para o projetor, eu comecei a ter demanda para produzir outras unidades para outros professores. Eu criei a Learning Technologies Inc. (LTI) em 1977. Usando o “MIT hobby shop” como uma incubadora, eu construí os primeiros doze sistemas, patenteando o projetor e o domo.

Atendendo professores na rede escolar e também a conferências de planetários com este novo estilo de planetário, o STARLAB passou a ser reconhecido e valorizado. Ao longo da trajetória de construir uma empresa, professores e planetaristas deram muitas sugestões para melhorias no designe e nas características do próprio STARLAB, que foram sendo incorporadas ao modelo: uma porta que se fecha sozinha, mais gomos para um formato mais esférico e uma ventilação mais eficiente.

O projetor foi melhorado, também: incluindo um motor, projetores para planetas e Lua, e estrelas mais brilhantes.

Uma variedade de cilindros que pudessem ser trocados possibilitou incorporar ideias criativas de professores, tais como: constelações das culturas: chinesa, sami (ártico), nativo-americana, grega, africana, egípcia e hindu; como também projeções para navegação, clima, geografia, biologia celular e geologia.

Esquerda: projeção do cilindro interior de uma célula. Direita: cilindro de astronomia cultural.

Projeção do cilindro interior de uma célula.

Deste modo, Sadler e sua empresa, criaram uma coleção de cilindros temáticos:

ASTRONOMIA

SL-321 Milky Way Starfield
SL-322 Constellations
SL-324 Urban Starfield
SL-326 Celestial Coordinates
SL-327 Deep Sky Objects
SL-328 Solar System & Galaxy
SL-362 Radio Sky
SL-369 Moon

MITOLOGIA

SL-352 Greek Mythology
SL-353 Ancient Egyptian Culture
SL-354 Native American Mythology
SL-355 Hindu Mythology
SL-356 Ancient Chinese Seasons
SL-357 Ancient Chinese Legends
SL-358 Lapp (Sámi) Mythology
SL-359 African Mythology
SL-361 Navajo Skies
SL-363 Polynesian Voyaging
SL-364 Inuit Star Lore

GEOGRAFIA

SL-333 Earth
SL-336 Geologic Time
SL-335 Geocentric Earth
SL-334 Plate Tectonics
SL-337 Ocean Currents
SL-338 Weather

HISTÓRIA

SL-329 Lewis & Clark Celestial Navigation
SL-330 The Civil War Sky
SL-360 Maya Skies

BIOLOGIA

SL-365 Biological Cell
SL-367 Transparent
SL-368 Bird Migration

Cada cilindro projeta um determinado tema e precisa ser trocado a cada mudança de apresentação.

Mais um desafio: A formação de professores e planetaristas!

Resolver o problema do projetor e do domo para se tornarem itinerantes e mais acessíveis foram os primeiros passos. Entretanto, insuficientes.

Sadler destaca a necessidade de preparar recursos educativos para orientar planetaristas (educadores e astrônomos) o uso do projetor itinerante.

Muitos que inicialmente compraram o StarLab original eram bastante criativos e sabiam exatamente o que queriam fazer com ele. Mas conforme a popularidade do projeto crescia, muitos novatos se interessaram também. A maioria sentia necessidade de ideias que se estabelecessem pontes com o programa curricular escolar. Então, começamos a coletar e organizar materiais que já tinham sido desenvolvidos e que pudessem ser adaptados a este novo tipo de planetário.

Achamos uma mina de ouro no livro Under Roof, Dome, and Sky  – um extraordinário manual de atividades planetárias para planetários permanentes desenvolvido pela National Science Foundation. Este manual era organizado por ano escolar, de modo que os professores pudessem escolher as atividades apropriadas ao ano escolar de sua turma.

Under Roof, Dome and Sky, MAPS, 1973, é vendido ou disponibilizado para sócios pela Middle Atlantic Planetarium Society. E pode ser baixado em http://www.mapsplanetarium.org/under-roof-dome-and-sky/.

O primeiro currículo desenvolvido exclusivamente para o STARLAB, Stars and Skies, foi financiado pelo Nebraska Department of Education. Ele pretendia ajudar os professores a utilizar os STARLABs fornecidos por instituições de Nebraska a unidades educacionais. Ele foi desenvolvido em 1979.

Estes guias se mostraram tão eficientes, que se tornaram parte dos materiais LTI enviados com cada STARLAB. Conforme os professores e coordenadores curriculares começaram a adaptar o Starlab a suas necessidades especificas, a Learning Technologies manteve um programa de intercâmbio para distribuir estas lições gratuitamente a todos os professores interessados.

Atualmente, cada cilindro possui um manual próprio que pode ser baixado diretamente do site da StarLab,

Um centro de desenvolvimento de novas ideias para o ensino de ciências, incluindo planetários, o Lawrence Hall of Science (LHS, Berkeley, Califórnia), começou a enfatizar a necessidade de interação com os planetários escolares.

Retomados com uma nova ênfase em atividades “hands-on”, onde as crianças são encorajadas a construir sua própria compreensão, o Holt Planetarium do LHS desenvolveu um programa de atividades para planetários com ajuda de astrônomos educadores.

O resultante Planetarium Educator’s Workshop Guide se tornou uma referência básica para todos  os diretores progressistas – inovadores – de planetários. Você pode fazer download em https://cdn.ymaws.com/www.ips-planetarium.org/resource/resmgr/pdf-pubs/1980educatorswkspguide_sr10.pdf.

Ele apresenta atividades baseadas explicitamente nas ideias das crianças e incluía suplementos e simulações para sala de aula. Este volume revitalizou a comunidade planetária, empurrando pequenos planetários às fronteiras da inovação.

O Lawrence Hall of Science também desenvolveu uma coletânea de recursos educativos chamada GEMS (GEMAS PRECIOSAS, Grandes Investigações em Matemática e Ciências), com volumes em conteúdos que perpassam pela física e astronomia.

Posteriormente, um novo programa foi a criação da coleção PASS (Planetarium Activities for Student Success) e as atividades do LHS foram bastante testadas com usuários de planetários tanto especializados quanto novatos.

Ela incluía um manual “How-To” para usar um planetário portátil e uma grande variedade de roteiros participativos, tais como:

  • utilizar as mudanças de aparência de objetos celestes para ensinar fundamentos de astronomia.
  • estudantes mapeiam o movimento de Marte contra as estrelas de fundo.
  • Eles plotam as mudanças de posição das Luas de Júpiter, como fez Galileu Galilei para descobrir seus períodos orbitais.
  • Eles recriam a viagem da Colombus e aprendem como navegar com as estrelas.
  • Os estudantes descobrem os conhecimentos astronômicos de antigas civilizações: os polinésios do Pacífico, o povo Hupa da Califórnia, as tribos das planícies e montanhas do Wyoming, os Anasazi do Novo México, o povo Maia do México e América Central e os Incas do Peru.

Download: http://www.lhs.berkeley.edu/pass/digital/PDFs/PlanetariumEducatorsWorkshopGuide2015.pdf

E foi expandido para uma série de 15 volumes e outros recursos que podem ser baixados no site da International Planetarium Society, IPS:

Atividades do Planetário (por Categoria)

Constelações

Sistema solar

Volumes PASS: 1 , 2 , 3 , 4 , 5 , 6 , 7 , 8 , 9 , 10 , 11 , 12 , 13 , 14 , 15 , índice

Índice

Sadler sempre esteve preocupado e dedicao ao ensino e aprendizagem de astronomia e ciências em geral, coordenando inúmeros projetos e programas de pesquisa na área.

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