Projeto Menos Plástico é Mais: entrevista com professoras Valéria Pereira e Giselle Correa da Silva

O Espaço Ciência Viva agradece a participação de Valéria Pereira e Giselle Correa da Silva, professoras no CEFET/RJ, Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, no Rio de Janeiro, em entrevista sobre o projeto que participam: MPEM, Menos Plástico é Mais, respondendo sobre o trabalho que realizam à luz da Década do Oceano que estamos. O projeto Menos Plástico é Mais propõe a coleta de lixo das praias da cidade do Rio de Janeiro, sua separação, reciclagem e a utilização de resíduos plásticos na construção civil.

Giselle Correa da Silva cursou bacharelado e licenciatura em química na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, e mestrado e doutorado em química na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro. É professora do CEFET/RJ e há 5 anos e trabalha com o projeto Menos Plástico é mais, junto com outros projetos na coordenação de Química.

 Valéria Pereira cursou licenciatura em Química e mestrado em química orgânica na UFRRJ. Seu doutorado na área de Química de Produtos Naturais foi realizado na UFRJ. Professora do CEFET/RJ, do campus Maracanã desde 2014. Atua no projeto Menos Plástico é Mais em parceria com a professora Giselle.

ECV: O projeto Menos Plástico é Mais já existe há alguns anos. Vocês mantêm uma base de dados que ajude a estimar quanto lixo já recolheram durante esse tempo, e vocês têm alguma avaliação do tipo de lixo que mais encontram?

Gisele: Temos uma base sim, e todo mutirão de limpeza alimenta esse banco de dados. 

Já coletamos 14161 bitucas de cigarro, pois em cada ida à praia recolhemos cerca de 3000-4000 bitucas, recolhemos também cerca de 1200 tampinhas plásticas, mais de 1200 embalagens inteiras e 1800 canudinhos.

Coletamos também centenas de outros materiais. Hoje é proibida a utilização de canudo plástico, mas na época que estávamos saindo para fazer as coletas ainda não era proibido, então encontrávamos muitos canudos. Até depois da lei entrar em vigor, ainda os encontrávamos já que as pessoas não queriam parar de usá-los. 

O lixo só é lixo por causa do seu destino, Recicle e você pode salvar o mundo.

Grupo de alunos do CEFET/RJ em mutirão do projeto Menos Plástico é Mais, na cidade do Rio de Janeiro, carregando banner com a mensagem: O lixo só é lixo por causa do seu destino, Recicle e você pode salvar o mundo.
Acervo das entrevistadas.

ECV: Considerando que estamos na década das ciências oceânicas e a importância que projetos como o Menos plástico é Mais tem para a proteção e conservação de ambientes marinhos, qual a importância que vocês atribuem a entrada de temas da ciência cidadã e da cultura oceânica nos espaços formais, informais e não formais de ensino?

Giselle: Bastante. Porque tanto os alunos quanto as pessoas que encontramos na praia não tem consciência de que o lixo que elas jogam em terra chega ao mar. Por mais que seja meio óbvio, elas não têm consciência de que aquele papelzinho de bala pode cair no esgoto, que pode cair no rio e chegar ao mar de alguma forma. Com respeito a cultura oceânica é isso, o que nós no meio terrestre estamos causando com certas atitudes, atitudes essas que chegam no mar. E chegam lá causando malefícios. Em uma de nossas visitas à praia encontramos com um grupo de apoio da Petrobras que estava indo coletar tartarugas mortas, e naquele dia às 15h já era a 3ª tartaruga que eles iam retirar.

Valéria: Acho que o homem nunca imaginou a que ponto isso chegaria. Você usa o recurso e aquilo vira lixo. E você faz o quê com aquele lixo? Poucas pessoas têm consciência, e essa consciência não adianta forçar, ela tem que vir de dentro para fora e ela só brota quando trabalhamos com números. Você apresenta e fala quanto de lixo cada um gera, qual o perigo. Já tive o desprazer de ver uma tartaruga toda enrolada em rede de pesca, degolada e estraçalhada. Você vê aquilo e pensa “Caramba isso podia ser evitado”. Não temos essa cultura, as pessoas acham que basta usar. Já ouvi de pessoas “Não tô preocupada com o futuro, você tá falando de 2050, em 2050 já estarei morto há muito tempo”, mas não é assim que devemos pensar. Esse é o maior ganho do Menos Plástico é Mais – quando fazemos as pessoas pensarem sobre aquilo que elas produzem. Como a Giselle falou muito bem, o lixo está na praia, mas antes de estar lá ele estava em outro lugar. É muito importante que ações como essa, não só o nosso projeto, mas outros com a mesma temática, levantem essa bandeira e alertem as pessoas para aquilo que elas estão causando. Qual efeito eu causo com as minhas atitudes?

Nós não temos noção, parece que é só um potinho de margarina, uma garrafa PET, mas quantas pessoas estão usando isso? As praias agora estão com menor frequência, ou pelo menos deveriam estar, mas continuam poluídas. As pessoas deveriam deixar só pegadas nas areias, mas deixam bebida, bituca de cigarro, tudo exposto. Esse cuidado não existe, e ele não existe por falta da educação ambiental básica, na minha visão.

Caixas para separação e reciclagem do plástico no CEFET/RJ.
Acervo das entrevistadas.

“Esse é o maior ganho do Menos Plástico é Mais – quando fazemos as pessoas pensarem sobre aquilo que elas produzem. (…) o lixo está na praia, mas antes de estar lá ele estava em outro lugar.”

ECV: Para terminar, se tivessem que passar alguma mensagem para educadores, profissionais da educação, gestores públicos e população em geral, qual seria?

Valéria: Acho que o segredo é “comecem”, a palavra, o verbo é “começar”. Existe um mal da gente em procrastinar tudo e a gente nunca se engaja realmente. Então comecem a trabalhar de casa com as famílias, quem é educador comece na instituição de ensino. “Ah, mas eu sou professora de língua portuguesa, de história ou de matemática e isso não tem nada a ver”. Tem, tem tudo a ver em todas as disciplinas, na sociologia, na filosofia, a questão do plástico, o impacto que isso causa na sociedade é para ser dito e falado por todos. Quanto mais a gente fala, mais efeito a gente vai ver. 

Sempre me apresento e falo “Fiz curso disso e daquilo”, mas uma vez fiz um curso no Espírito Santo, na época em que morei lá, de Educação Ambiental pela instituição em que eu trabalhava. Foram 15 dias muito felizes da minha vida. Houve uma modificação na pessoa Valéria. Cada dia a gente trabalhava uma temática diferente. 

A educação ambiental conduzida de forma séria, de modo que você consiga refletir, de modo que toque o coração das pessoas, as modifica. Você vai cuidar do meio ambiente mesmo que ninguém esteja olhando, você vai recolher papel do chão e colocar na bolsa, no bolso da calça, inclusive. Acho que é isso, temos que começar. Já escutei muito “Que bobeira, vocês vão para a praia, ficam lá e acham que vão resolver o problema de Ipanema, de Copacabana?” Não, não vamos resolver, mas para aquele pedaço que limpamos, para as pessoas que interagiram, para quem leu nossa faixa que mostra a importância de recolher o lixo, se para aquelas pessoas aquilo já significou, então temos que continuar. Colocamos a culpa no tempo “Não tenho tempo, não vai dar em nada”, mas a gente sempre fala que fazemos trabalho de formiguinha, é melhor fazer pouco do que não fazer nada.

Giselle: Invistam nas crianças, elas são o nosso futuro, começando por elas temos a certeza de que o futuro vai ser bem melhor.

Valéria: Em 2050 a previsão é de que tenhamos mais plásticos do que peixes no mar. Essa é a previsão catastrófica que temos e acho que uma coisa é falar e outra é imaginar.




“Invistam nas crianças, elas são o nosso futuro, começando por elas temos a certeza de que o futuro vai ser bem melhor.”

Estudantes do CEFET/RJ em mutirão do projeto.
Acervo das entrevistadas.

Temos uma imaginação frouxa e já nos imaginamos nesse mar de plástico, isso é muito triste e temos que fazer alguma coisa. Todos são seres vivos, todos têm importância da mesma forma, não importa se é uma tartaruga ou um peixe, e é isso que falta em termos de coletividade. Olhamos muito para o lado da produção e ganho e esquecemos a conexão do homem com a própria natureza. Nos desconectamos em algum momento e precisamos nos reconectar. Não achar que o que eu estou fazendo não vale nada porque é pouco, porque se todo mundo pensar assim a gente não faz nada, acho que essa é a lição. 

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