O que ozônio tem a ver com goiabeira? Entrevistando a Dra Cláudia Furlan

Foto da Profª Drª Cláudia Furlan. Imagem cedida do arquivo pessoal da entrevistada.

Episódio: “De olho na goiabeira” – O que diz o especialista?!

Equipe: Dayene Silva, Mariana Elysio, Jaciele Sotero, Larissa Andrade, Profª Drª Eleonora Kurtenbach

A professora Drª Cláudia Furlan é formada em Biologia, possui mestrado e doutorado em Ecologia pela Universidade de São Paulo (USP), e pós-doutorado pela Universidade de São Paulo e pela Universidade de Turku, Finlândia . Atua em disciplinas na graduação e pós-graduação e em atividades de extensão do Instituo de Biociências da USP. Suas pesquisas tem como foco a identificação e quantificação de produtos naturais que estão envolvidos na resposta de defesa vegetal a fatores de estresse abiótico (ozônio, radiação UVB, seca, elevadas concentrações de CO2) e caracterização química de Angiospermas nativas buscando por metabólitos bioativos.

A goiabeira, Psidium guajava, é uma espécie vegetal estudada por muitos grupos de pesquisas no Brasil e no mundo. Procuramos a  professora Drª Cláudia Maria Furlan, representante do Laboratório de Fitoquímica da USP, e a convidamos para uma entrevista onde ela explica seu trabalho com espécies bioindicadores vegetais de poluição do ar.
A goiabeira é uma dessas árvores que nos ajudam a monitorar a saúde do ambiente ao nosso redor . 
As substâncias usualmente consideradas poluentes do ar são os compostos de enxofre (SO2, SO3, H2S, sulfetos); compostos de nitrogênio (NO, NO2, NH3, HNO3, nitratos); monóxido de carbono e dióxido de carbono; ozônio e outros.
Existe um padrão da qualidade do ar que determina o grau de toxicidade de cada um desses poluentes a fim de garantir a segurança da saúde humana. Atualmente, o Ozônio é o poluente mais preocupante. Na entrevista com a professora Cláudia Maria Furlan você vai descobrir o porquê e também vai entender como a goiabeira, Psidium guajava, responde aos danos e altera suas características morfológicas e fisiológicas, uma vez exposta a ambientes com alta concentração de ozônio.  

Confira a entrevista: 

Espaço Ciência Viva : Dentre os gases poluentes do ar, existe um ranking com os mais danosos à vida na Terra. O presente trabalho submeteu testes com o gás Ozônio. Por quê?

Profª Drª Cláudia Maria Furlan:

Sim, existe o chamado padrão de qualidade do ar que estabelece níveis para alguns poluentes atmosféricos, como dióxido de enxofre (SO2), óxidos de nitrogênio (NOx), ozônio (O3), material particulado (MP), entre outros [você pode saber mais em https://cetesb.sp.gov.br/ar/]. Esses padrões são baseados na segurança da saúde humana e no grau de toxicidade de cada um desses poluentes. Hoje já é conhecido que alguns desses níveis, seguros para a saúde humana, são ainda tóxicos para a vegetação (podem causar danos ambientais). Atualmente o poluente de maior preocupação é o Ozônio, por ser um poluente chamado secundário, ou seja, não é emitido diretamente pela indústria ou pelo escapamento do carro, mas é formado na atmosfera quando há a presença de precursores e luz. Outro gás atmosférico de preocupação atual é o dióxido de carbono (CO2), com concentrações elevadas nos últimos anos e um dos gases que contribuem para o efeito estufa. Quanto ao estudo com a goiabeira, os primeiros no Brasil foram realizados na região da Serra do Mar próxima ao complexo industrial de Cubatão, em área de Floresta Atlântica, onde essa espécie tem grande ocorrência. Nesse período a espécie foi testada como uma possível bioindicadora em estudos com outros poluentes de ocorrência nessas áreas próximas a Cubatão. O experimento com ozônio foi um passo natural para complementar os estudos com a goiabeira e seu potencial como bioindicadora de poluentes atmosféricos, pensando também na grande importância atual desse poluente.

Espaço Ciência Viva : O Brasil é o maior produtor de goiaba do mundo. Como utilizar a goiaba como bioindicador poderia ser vantajoso para o nosso país? E sob quais aspectos?

Profª Drª Cláudia Maria Furlan:

As espécies vegetais que crescem em áreas contaminadas apresentam diferentes respostas aos poluentes, podem não suportar tamanha carga de poluição e simplesmente desaparecerem dessa região. Essas alterações são classificadas como danos não visíveis, mas algumas espécies, como a goiabeira, por exemplo, apresentam danos visíveis em suas folhas, e esses danos são característicos e associados a um poluente de forma dose dependente, os danos surgem e aumentam com o aumento da concentração do poluente ou do tempo que a planta fica exposta a ele.

Aqui no Brasil, ainda não temos a prática de utilizar o biomonitoramento de poluentes atmosféricos. Isso é mais comum em países da Europa e nos EUA, onde é possível encontrar guias com fotos das varias espécies estudadas e dos danos foliares associados ao ozônio, o que torna mais fácil para a população observar a espécie, tais sintomas e alertar as agências de monitoramento que a área pode estar com maior nível de ozônio, por exemplo. Outra importância desses estudos é fornecer dados sobre a produtividade de espécies comerciais, como a goiabeira, por exemplo, quando sob o efeito de concentrações toxicas de poluentes. Por fim, tais estudos também podem ser utilizados para politicas publicas, na tomada de decisões sobre parâmetros que protejam não somente a saúde humana, mas também a saúde ambiental.

Espaço Ciência Viva : Existem outros estudos sobre a utilização da goiabeira como bioindicador de outros tipos de poluentes?

Profª Drª Cláudia Maria Furlan:

Sim, os primeiros artigos publicados pelo grupo de estudo de SP relatam a goiabeira como acumuladora de enxofre e fluoretos em suas folhas, e mostram algumas alterações no crescimento quando esse acumulo é aumentado. Há também estudos com a goiabeira em experimento controlado com elevado CO2, tentando entender como a goiabeira reagiria em um cenário de mudanças climáticas e aumento de temperatura.

Espaço Ciência Viva : A senhora acha importante divulgar estes e outros conhecimentos que envolvem o uso da goiaba, não só para alimentação, como em tantos outros aspectos como os apresentados no vídeo “De olho no jardim”? Por quê?

Profª Drª Cláudia Maria Furlan:

Neste caso de uso como indicador de poluente, seria o uso da goiabeira, e não dos seus frutos. Eu acho importante a divulgação, especialmente porque essa espécie é uma das mais comuns em arborização em cidades e também umas das mais plantadas em sítios e chácaras particulares. Além disso, é uma planta muito utilizada na medicina tradicional, como vocês mostraram no vídeo. Conhecer mais uma faceta dessa espécie é interessante. Além disso, isso leva ao conhecimento de que as plantas também podem nos ajudar a monitorar a saúde do ambiente ao nosso redor.

Você pode conferir na íntegra o artigo da Profª Drª Cláudia Maria Furlan e seu grupo de pesquisadores sobre uso da goiabeira como bioindicador, clicando neste link https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0269749106005549

Profª Drª Cláudia Maria Furlan o Espaço Ciência Viva agradece a sua contribuição para a divulgação científica falando um pouco mais sobre a goiabeira e suas diversas aplicações nas pesquisas científicas.

Deixe um comentário