Arco-íris: as explicações filosóficas naturais.

Arcos coloridos sobre Buenos Aires. APOD. NASA.

Paulo Henrique Colonese, Mariana de Souza Lima, Espaço Ciência Viva.

Uma nuvem iridescente sobre a Etiópia. Esther Havens. APOD.

Todas as histórias e explicações mágicas e mitológicas do arco-íris não deixaram de despertar os anseios intelectuais em busca da verdade por trás das observações naturais, baseada na razão humana.

E foi na Grécia antiga que a humanidade começou a tentar explicar o mundo físico de maneira natural, descrevendo suas observações naturais, e estabelecendo relações de causa e efeito distantes da magia e dos deuses, dando origem à Filosofia Natural.

Inicialmente, os Filósofos Naturais denominaram os fenômenos atmosféricos de meteoros luminosos, abrangendo uma grande classe de fenômenos, tais como, relâmpagos, arco-íris, halos, etc. O termo “meteoro” vem do grego μετέωρος metéōros “elevado; alto (no céu)” (de μετα- meta- “acima” e ἀείρω aeiro “eu levanto”), ou seja, algo “elevado no céu”.

Naturalmente, as primeiras tentativas de explicações naturais que deixava de lado a influência de divindades não foram bem aceitas, levando os primeiros pensadores naturais a possíveis castigos e punições impostos por “deuses” (fanáticos religiosos).

Anaxágoras de Clazomenae: nuvem esférica e luz.

Anáxagoras (direita). Eduard Lebiedzki, segundo um design de Carl Rahl, 1888.

O primeiro que ousou dar uma explicação natural para a luz foi Anaxágoras de Clazomenae (500, atual Urla, Turquia – 428 a.C., Lampsacus, Turquia). Ele vivia sob domínio do Império Persa, mas conseguiu ir trabalhar durante muito tempo em Atenas.

Ele negou a divindade do Sol, afirmando que se tratava apenas de “uma grande pedra em brasa” ou “uma bola de fogo”, sendo considerado ímpio e por isso acabou sendo preso. Porém, com a intervenção de Péricles (general grego), foi libertado.

Anaxágoras e Péricles. Augustin-Louis Belle  (1757 – 1841).

Um tempo depois de ser libertado, cometeu um ato de impiedade ainda maior ao explicar de maneira natural o arco-íris, pondo dessa forma em dúvida a divindade da Deusa Íris. Para ele, o arco era apenas a reflexão do Sol numa nuvem esférica.

“A forma da nuvem, mais do que a presença de pequenas gotículas, era, para ele, a base da explicação do fenômeno” ( BERNARDO, Luís Miguel. História da Luz e Cores: 1. Vol. 2. ed. Porto: Universidade do Porto, 2009. pág. 64).

DEMÓCRITO DE ABDERA: O atomista, cores e ângulos de visão.

Demócrito de Abdera, (460 a.C.,Abdera – 370 a.C., ) nasceu em Abdera, região da Trácia, filho de família nobre e rica. Ele foi discípulo e depois sucessor de Leucipo de Mileto. Sua fama decorre do fato de ele ter sido o maior expoente da teoria atômica ou do atomismo. De acordo com essa teoria, tudo o que existe é composto por elementos indivisíveis chamados átomos (do grego, “a“, negação e “tomo“, divisível. Átomo= indivisível). Não há certeza se a teoria foi concebida por ele ou por seu mestre Leucipo, e a ligação estreita entre ambos dificulta a identificação do que foi pensado por um ou por outro. Todavia, parece não haver dúvidas de ter sido Demócrito quem de fato sistematizou o pensamento e a teoria atomista. Demócrito avançou também o conceito de um universo infinito, onde existem muitos outros mundos como o nosso.

Abdera.
O filósofo que ri. Demócrito de Abdera,

Ele passou a ser conhecido como o Filósofo que ri.

Demócrito afirmava que as cores do arco-íris dependiam da posição de onde o arco era observado.

Aristóteles de Estagira-Atenas: reflexos e espelhos.

Filosofia: A Escola de Aristóteles. Fresco, 1883/88, de Gustav Adolph Spangenberg (1828-1891).
Do ciclo “As quatro faculdades”. Em 335 a.C. Aristóteles funda sua própria escola em Atenas, em uma área de exercício público dedicado ao deus Apolo Lykeios, daí o nome Liceu.

Aristóteles de Estagira (384 a.C., Estagira – 322 a.C., Atenas) tentou dar uma explicação que se  enquadrasse nas condições meteorológicas e geométricas associadas ao surgimento do arco-íris.

Busto em homenagem a Aristóteles.

Baseou suas explicações nos fenômenos da reflexão da luz solar que ocorre nas gotas de água derivadas da nuvem. Onde as gotículas de água se comportavam como pequenos espelhos e por causa da natureza da luz se originavam as cores.

 Aristóteles identificava apenas três cores que seriam a mistura em diferentes proporções da luz branca e da sombra. Uma teoria de cores que iria durar mais alguns milênios.

Possidônio de Rhodes, o “Atleta”: as cores do arco-íris são ilusórias.

Possidônio de Rhodes (135 a.C., Apameia (atual Síria) – 51 a.C., Rhodes ou Roma). Possidônio, em seus escritos sobre meteorologia, teorizou sobre as causas de nuvens, névoa, vento e chuva, bem como a geada, granizo, raios e o arco-íris.

Ele também estimou que a fronteira entre as nuvens e os céus fica a cerca de 40 estádios acima da Terra.

Discordava de Aristóteles quanto ao número de cores presentes no arco-íris. Para ele constituiriam várias cores e não seriam reais e sim ilusórias.

Sêneca

Sêneca, ( 4 a.C., Córduba, Espanha – 65 d.C., Roma ) foi um filósofo romano. Seu pai era Sêneca, o Velho; seu irmão mais velho era Lucius Junius Gallio Annaeanus e seu sobrinho, o poeta Lucan.

Foi levado jovem para Roma, onde se tornou estudante de Sextius. E onde mais tarde se tornaria tutor do jovem Nero que o condenaria à morte mais tarde, já como imperador.

Parte de sua obra está reunida em Naturalis quaestiones, Questoes Naturais que discute diversos fenômenos meteorológicos.

Como Possidônio, Sêneca pensava que as cores do arco-íris eram incontáveis. Achava também que as cores eram provocadas por peculiaridades nas nuvens (existência de saliências ou depressões mais ou menos densas e com diferentes consistências). Sêneca (55 a.C.–39 d.C.) associou a aparição do arco-íris a prognósticos de mudanças climáticas e sugeriu a ideia da formação das cores pela colisão dos raios do sol com as nuvens (Boyer, 1959, p.59), utilizando a analogia do prisma para as nuvens e de pequenos espelhos para as gotas de chuva.

Concordava com Possidônio também quanto às cores serem ilusórias apesar de provenientes do Sol.

Os primeiros passos da Filosofia Natural

Apesar das explicações de alguns filósofos naturais estarem mais próximas do correto do que algumas considerações de Aristóteles, por ele ser a grande autoridade intelectual da época, e ser adotado pelo cristianismo, faz com que suas explicações perdurarem os próximos milênios no mundo ocidental cristão.

A partir do século V a.C. se inicia o declínio da religião politeísta grega, tornando os estudos sobre os fenômenos naturais menos “perigosos” para os filósofos. Começamos a entender um pouco como foi o inicio desse declínio ao ler um trecho da história contada por Supico de Morais.

Querendo Pericles, General dos gregos, dar uma batalha naval, sucede-o um eclipse. Temerosos os soldados, e mais que todos, o piloto da sua nau de tão infausto anuncio, tirou Pericles a capa, e pondo-a nos olhos, lhe perguntou: Tens agouro disto? Pois não é outra coisa o eclipse ( BERNARDO, Luís Miguel. História da Luz e Cores: 1. Vol. 2. ed. Porto: Universidade do Porto, 2009, pág. 38).

A atitude anti-sobrenatural e anti-superticiosa descrita, exemplifica a postura de alguns gregos importantes ante os fenômenos naturais a partir do século V a.C.

Com o decaimento gradativo da explicação mítica dos fenômenos naturais, pouco a pouco foi possível estabelecer novas investigações e descobertas. E com o avanço das descobertas naturais, surgiu o embate entre artistas e cientistas.

Alguns artistas e poetas veriam a explicação dos fenômenos naturais como “antipoéticos”. Como é o caso do poema do filósofo fascista David Herbert Lawrence (1885-1930) que expressa uma visão negativa do conhecimento científico, como vilão da poesia e estética.

O conhecimento matou o sol, transformando-o numa bola de gás com manchas […]. O mundo da razão e da ciência […], esse é o mundo seco e estéril que a mente abstrata habita.