Observatório a Olho Nu Aldebaran

Capa. Observatório a Olho Nu Aldebaran, Campinas.

Série AST: Astronomia sem Telescópio. Observatórios a Olho Nu.

O Observatório a Olho Nu Aldebaran foi inaugurado em 1986 e permaneceu com suas atividades até 1995, coordenado pelo Prof. Marcio D’Olne Campos. Apesar de sua breve existência é uma experiência pioneira e inovadora com o resgate do Olhar ou Mirar o Céu.

Apresentamos abaixo, um artigo sobre o Observatório que apresenta sua proposta.

A OLHO NU, UMA NOVA RELEITURA DO MUNDO

A Natureza fala por muitas bocas.

Mas é preciso ter ouvidos para ouvir suas mensagens.

O Céu conta histórias, orienta, avisa.

Basta ter olhos para olhar.

Desvendar os seus recados, mesmo sem lunetas, telescópios.

De que adianta saber ligar o computador,

Se não se sabe contar?

O Observatório A Olho Nu de campinas

é uma visão do passado apontando para o futuro.

Aonde os astronautas de amanhã

Podem aprender hoje que,

No Brasil, [a função do] o “Norte” devia ficar no Sul

—só não fica porque as noções de Astronomia

usadas aqui foram trazidas de outro hemisfério.

Mas não é tarde para aprender,
É bom saber que este observatório
 está sendo implantado na Unicamp,
Considerada uma das mais modernas universidades do país.
 
Modernidade também é isso.
Como também pode ser moderno
 juntar o olho mágico do cinema
com o claro brilho da Antártida
ou as sombras da floresta tropical,
Oficio que se deu o cineasta [Jorge] Bodanzky,
Ou buscar entender se o pânico do cotidiano
se esconde em armadilhas da mente ou pode ser
desalojado quimicamente através de remédios,
dilema que a Ciência busca responder.
Ou ainda, se as imagens de uma vila
nascendo na Amazônia sobre os escombros da floresta
é o que pode haver de mais moderno
nessa parte que nos coube do latifúndio.

Josimar Melo

Assim é, se lhe parece. Pirandello.

OS INSTRUMENTOS ESCONDIDOS

Marisa Naggar

Olhar para o céu. Observar o Sol e a Lua. Identificar astros e constelações.

Tudo isso sem usar instrumentos óticos. Uma simples constatação a olho nu.

Possível a partir de qualquer lugar do mundo.

E necessária para a compreensão das relações entre o ser humano, o meio ambiente e os astros.

O Observatório a Olho Nu ficava dentro da Unicamp, em Campinas (SP) e também era chamado de Aldebaran, que em árabe significa o Olho Do Touro — nome da estrela localizada na Constelação do Touro.

O observatório é circular e serve como ponto de referência permitindo uma melhor orientação no espaço. O disco, que tem um diâmetro de 30 metros, representa o horizonte e a coluna central é o ponto de mira.

“É como se o mundo fosse plano e o eixo do universo a coluna”, explica Marcio D’Olne Campos, físico, etnoastrônomo (estuda o conhecimento que as populações nativas têm do céu) e diretor do observatório mantido pela universidade.

Apesar de não usar equipamentos de aumento — binóculos, telescópios e lunetas — motiva-se a observação através da proçura e identificação dos “instrumentos” escondidos da natureza.

Esses instrumentos — ipês, picos, vales, montanhas e o próprio horizonte, entre muitos outros — revelam-se como indicadores e marcadores de tempo.

Além deles pode-se utilizar equipamentos de alinhamento como estacas, marcas e montanhas e instrumentos convencionais como a régua, o relógio de sol, o transferidor, o espelho e o calendário.

Para quem tem um relógio, basta prestar atenção nas diferentes posições do sol e anotar os horários. Para aqueles que não usam o contador do tempo, como os índios, a solução é apenas observar o astro em diferentes posições.

No amanhecer, antes e depois de atingir seu ponto mais alto e, finalmente, no pôr-do-sol.

Muitas aldeias indígenas são circulares e têm um caminho que as divide em duas metades (a norte e a sul).

A entrada é no nascente e a saída no poente. O caminho do sol. Um relógio natural do tempo.

Essa configuração ajuda a estabelecer pontos referenciais que facilitam a observação. A partir disso, os índios observam o céu e o meio ambiente para poder definir a época certa dos seus diferentes rituais. Assim também conseguem determinar a chegada das chuvas.

A exemplo do que acontece nas aldeias, também entra-se no observatório pelo leste. A semelhança de forma entre o observatório e algumas aldeias sugere a influência dos índios no trabalho desenvolvido por Marcio.

UM OBSERVATÓRIO REAPROXIMA O HOMEM DO SOL, DA LUA E DA NATUREZA

Mas o observatório não funciona apenas para os amantes das estrelas e da lua. É um laboratório da natureza. Um observatório natural de espaço e tempo.

Lá, o ipê amarelo, que floresce nesta época do ano em Campinas, é um símbolo do meio ambiente e marcador natural de tempo. Ele depende do referencial local de observação.

Segundo Marcio Campos, a ideia é fazer as crianças observarem a natureza com maior frequência e atenção. E das conclusões feitas a partir dessa observação, incentivar a redescoberta de uma leitura do mundo que não sela aquela unilateral, pronta, geralmente ditada pelos professores e livros.

“PREFIRO PARTIR DA PREMISSA QUE É PRECISO OBSERVAR PRIMEIRO PARA DEPOIS PODER COMPREENDER OS FENÔMENOS DA NATUREZA”, DIZ ELE.

Inspirado nas aldeias indígenas circulares, em monumentos megalíticos pré-históricos como Stonehenge, na Inglaterra, no observatório de Jaipur, na índia e nas construções com alinhamento astronômico das antigas civilizações do México, do Peru e da Guatemala, Aldebaran foi inaugurado em abril de 1986.

Paulo Freire e Marcio D’Olne Campos, grandes mestres inspirando a aprendizagem sobre o Universo.

Ficarua “aberto” 24 horas por dia e a entrada é gratuita. De acordo com seu diretor, funciona também como praça e palco, que une Cultura, Lazer, Ciência E Arte. Durante o ano são promovidos cursos de extensão universitária e visitas guiadas por monitores treinados pelo observatório.

Um passeio até lá poderá aguçar a percepção da natureza:

– E talvez até uma consideração e revisão necessária dos conceitos transmitidos pela sociedade moderna.

Isso porque apontar o braço direito para o nascente para determinar a direção norte é um conhecimento importado do hemisfério Norte e não adaptado ao Sul. Essa primeira consideração serve para o hemisfério Norte de onde se vê a estrela Polar.

No hemisfério Sul, não se vê essa estrela porque ela está abaixo do horizonte.

“Por isso deveríamos apontar o braço esquerdo para o nascente. Estaríamos então olhando para o sul —direção que nos orienta a partir do Cruzeiro do Sul”, explica Campos.

Pena que normalmente as pessoas observem pouco o céu, o sol, a lua, as estrelas e a natureza e aceitem as tabelas e os calendários sem questioná-los e entendê-los. Afinal, como disse um sertanejo da cidade de Central, na Bahia, “o céu era a televisão dos antigos”.

OBSERVATÓRIO A OLHO NU era localizado na Universidade de Campinas. Estrada Unicamp-Telebrás Km 1,5. Caixa Postal 6165, CEP 13081, Campinas-SP.

Esta matéria foi copiada da publicada em VIVA FOLHA, A OLHO NU, UMA NOVA RELEITURA DO MUNDO. Folha de São Paulo. Setembro, 1988, número 6. https://www.sulear.com.br/FSP_VIVA_A_Olho%20Nu.pdf

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