Capa: Pintura aborígene com padrões geométricos, Crédito esther1721, acervo Pixabay. Licença CC0 1.0. Dedicação ao Domínio Público.
Vejamos algumas das contribuições de quatro educadores matemáticos: Willy Servais, Pedro Puig Adam, Tamas Varga e Carlos Mathias para a Humanização da Matemática.
Willy Servais: A Beleza da Matemática
Willy Servais (1913-1979), professor matemático belga e fundador da Sociedade Belga de Professores de Matemática (1953), destaca a importância da matemática no contexto de uma cultura mais ampla.
Ensinar é um ofício difícil, talvez impiedoso, pois não podemos dar a nossos estudantes o que nós mesmos não somos. O melhor em nosso ensino é, no final das contas, a humanidade que há em nós mesmos. Se não propusermos nada humano, nosso papel é irrisório.
Willy Servais, Conferencia de las Jornadas de Rennes, 1976.
Ele defende um ensino da Matemática mais humanizado e propõe uma aproximação entre a compreensão intuitiva e a abstração.
Há que aprender, por meio da prática material e intelectual, a matematizar e matematizar tão logo seja possível, ou seja, desde que a criança ou o adolescente tenham reações que testemunhem uma compreensão intuitiva e eficaz do que se trata quando se abstrai, se define e se deduz matematicamente. (SERVAIS, 1981, p.3).
Servais (1979, pp.20-21) indica três dimensões desta humanização ou formação cultural matemática:
“a intelectual, a estética e a moral (ética)”.
Ele analisa e cria categorias sobre o impacto emocional e comportamental (1979, pp.10-12) que a disciplina Matemática exerce sobre os estudantes: indo do terror à paixão e a influência que estes fatores exercem sobre a construção de uma cultura matemática pessoal e social.
Servais estabeleceu também indicadores para a observação do desenvolvimento destas três dimensões.
Para a formação cultural estética matemática, Servais (1979) propõe os seguintes objetivos:
- Despertar e afirmar o gosto pela beleza matemática presente em certas relações, fórmulas, figuras, demonstrações e teorias.
- Cultivar o gosto pela expressão do pensamento: clareza, ordem, concisão, elegância.
- Fazer presente e apreciar as relações entre a matemática e a beleza formal das artes: equilíbrio arquitetônico; comparação das artes plásticas (desenho, pintura, escultura); ritmo e estruturas nas artes (música, cinema);
- Sensibilizar por meio da beleza das formas e de organização na natureza e na técnica. (SERVAIS, 1979, pp.20-21).
Pedro Puig Adam: A Intuição Matemática
O matemático espanhol Dom Pedro Puig Adam (1900-1960) em colaboração com Julio Rey Pastor publicou vários livros para o ensino de Matemática:
- “Elementos de Aritmética Intuitiva” (1950),
- “Elementos de Geometria Intuitiva” (1956),
- “Metodologia e Didática da Matemática Elementar”
e individualmente “O material didático matemático atual” (1958), introduzindo métodos intuitivos no ensino e defendendo uma aula ativa em ambientes de oficinas.
Puig também criou jogos, como os Geoespaços (adaptação dos geoplanos de Gattegno) para o estudo da geometria espacial e organizou em Madrid a XI Reunião da Comissão Internacional para o Estudo e Melhoramento do Ensino da Matemática (1957) que incluía uma Exposição de Material Didático.
Puig é autor do “Decálogo do Professor de Matemática” (1958) que poderia bem estar fixado em cada sala de aula ou laboratório de ensino de Matemática:
- Não adotar uma didática rígida, mas sim adaptá-la em cada caso ao aluno, observando-o constantemente;
- Não esquecer a origem concreta da Matemática, nem os processos históricos da sua evolução;
- Apresentar a Matemática como uma unidade relacionada com a vida natural e social;
- Guardar cuidadosamente os planos de abstração;
- Ensinar, guiando a criatividade e o espírito de descoberta do aluno;
- Estimular a criatividade, despertando o interesse direto e funcional até ao objeto do conhecimento;
- Promover sempre que possível a autocorreção;
- Conseguir alguma maestria nas soluções antes de automatizá-las
- Ter atenção a que a expressão do aluno seja a tradução correta do seu pensamento;
- Procurar que todo o aluno tenha êxito para evitar o desânimo.
(ADAM, P. P. 1958, s/p, tradução própria)
A educadora Emma Castelnuovo (1964) homenageou Puig com a publicação da obra “Ideas actuales de la Matemática y su didáctica: homenage a Pedro Puig Adam (1900-1960)”. Puig contribui para a reflexão sobre materiais didáticos no ensino-aprendizagem da Matemática, refletindo sobre os aspectos estéticos, emocionais e culturais da aprendizagem matemática.
A Federación Española de Sociedades de Profesores de Matemáticas criou em 2000, no Ano Mundial da Matemática, o Dia Escolar da Matemática em sua homenagem, estabelecido no dia de seu nascimento, 12 de maio. Curiosamente no mesmo mês do Dia Nacional da Matemática no Brasil (6 de maio, em homenagem ao Prof. Malba Tahan).
Tamas Varga: Um Centro Cultural Matemático
Tamas Varga (1919-1987), professor matemático húngaro, após assistir a uma conferência de Zoltán Dienes em 1961, tomou a decisão de iniciar uma experiência educacional em uma sala de aula, como primeiro passo para a elaboração de uma nova proposta curricular para o ensino primário em seu país. Em 1962, no Simpósio Internacional sobre o Ensino de Matemática, organizado pela UNESCO em Budapeste, Varga e Servais foram encarregados de escrever um livro sobre as descobertas mais importantes do Simpósio.
Baixe o livro no site da UNESCO (em inglês): Teaching School Mathematics.
Em 1963, Varga lançou um projeto de educação experimental em várias turmas em Budapeste, colocando sua teoria em prática. Em 1967 foi empregado pelo National Pedagogical Institute, onde refinou suas experiências educacionais.
Sua abordagem:
- foca o pensamento individual das crianças
- coloca o professor no papel de auxiliar dos estudantes
- e pensa o espaço escolar como um Centro Cultural.
Em 1978, lançou o novo currículo nacional húngaro, com a colaboração de Endréné Gádor, Sándor Pálfy, Istvánné Halmos, Eszter C. Neményi e Julianna Szendrei.
Varga é também um dos pioneiros no uso de situações cotidianas no ensino de matemática e no desenvolvimento de Fichas de Trabalho para os estudantes. A última versão de sua proposta curricular foi adotada na Finlândia como o Projeto Mathland.
Os três autores se preocuparam com aspectos culturais da Matemática e se dedicaram à criação de materiais didáticos e projetos curriculares, sendo referência para a dimensão cultural da Matemática em laboratórios de ensino e aprendizagem de matemática.
Carlos Mathias: Uma Matemática Humanista
Carlos Mathias Motta é um educador matemático carioca, músico e professor associado do Departamento de Matemática Aplicada da Universidade Federal Fluminense.
Carlos Mathias é um dos precursores da Filosofia Humanista da Matemática no Brasil, que originalmente foi proposta pelos matemáticos e filósofos Reuben Hersh e Alvin White, na década 90.
A Matemática Humanista é uma filosofia que entende a natureza das matemáticas como sendo histórica e cultural, assim como faz a Etnomatemática (Ubiratan D´Ambrosio) e o Socioconstrutivismo (Paul Ernest). A filosofia humanista situa posicionamentos diante do ensino e da aprendizagem de Matemática bastante diferentes daqueles mais usualmente vividos nas escolas e nas universidades. Seu foco está nas pessoas, na aprendizagem, não no “ensino de conteúdos”.
Conheça mais suas ideias e participe do site e redes sociais da Matemática Humanista . Acompanhe a programação do Matemática Humanista em seu Canal Youtube e da série de podcast Matemática Humanista, o primeiro podcast sobre Educação Matemática e Matemática Humanista do Brasil! Entrevistas, reviews de livros e eventos, humor e arte em clima de rádio! (14 episódios).
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Referências
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ADAM, P. P. Decálogo Del Professor de Matemática. 1958. Disponível em <http://www.arrakis.es/~mcj/textos/decalogo.zip>. Acesso 3 mar. 2012.
ADAM, P. P. El material didáctico matemático actual in XIa. Reunión de la Comisión Internacional para el Estudio y Mejora de la Enseñanza Matemática y Exposición Internacional Simultánea, 21-27 abr., 1957, Ministerio de Educación Nacional, Inspección Central de Enseñanza Media, Madrid, 1958b.
ADAM, P. P., La Matemática y su Enseñanza Actual. Publicaciones de la Dirección General de Enseñanzas Medias. Ministerio de Educación Nacional, Madrid, 1959.
ADAM, P. P., PASTOR, J. R., Elementos de Aritmética Intuitiva, Madrid: Afrodisio Aguado, 1950.
ADAM, P. P., PASTOR, J. R., Elementos de Geometria Intuitiva, Madrid: Nuevas Gráficas, 1956.
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CASTELNUOVO, E. Ideas actuales de la Matemática y su didáctica: Homenaje a D. Pedro Puig Adam (1900-1960), Dirección General de Enseñanza Media, Madrid: Editora Madrid, 1964.
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Paulinho
Amei como abordou esses educadores matemáticos pioneiros do que fazemos nos laboratórios, desde a década de 1990, no Brasil. Foi muito feliz ao recorda- los.